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CURSO BÁSICO DE ESPIRITISMO

Parte 1 - Capítulo 12

Desencarnação - Um caso como exemplo


Para facilitar a compreensão dos fenômenos de morte física, relataremos o que consta no livro "Obreiros da Vida Eterna" - capítulo XIII, sob o título: "Companheiro Libertado".

No capítulo, André Luiz, um Espírito, descreve as providências tomadas no plano espiritual para o amparo fraterno a um homem, Dimas, que estava prestes a sofrer a morte física para voltar ao mundo dos Espíritos.

É importante observarmos que o caso apresentado como exemplo é o de um homem comum que, sendo médium espírita, dedicou-se a socorrer os necessitados, colaborando com uma Instituição Espírita e, com isto, conquistou a amizade de muitos Espíritos bons.

Dimas, renascendo na Terra com a tarefa da mediunidade, sentiu-se atraído para o Espiritismo.

Mas, se tivesse nascido sem tarefa mediúnica; se, ao invés de se tornar espírita, tivesse seu pensamento orientado por qualquer outra religião, mas praticasse o bem em favor de seu próximo, o seu mérito pela prática do bem seria o mesmo e conquistaria a amizade de Espíritos bons.

Aos estudarmos esta aula, tenhamos também em mente não existirem dois casos de reencarnação ou desencarnação idênticos em suas particularidades, pois estas particularidades dependem do bom ou mau uso que tenha sido feito pelo Espírito, quando no mundo espiritual, ou pelo homem, quando na Terra, das oportunidades que recebeu da Lei Divina, para evoluir.

No caso de Dimas, nesta existência ele nascera em ambiente pobre e, desde criança, lutou muito para viver. Não tendo oportunidades de frequentar escolas, não conseguiu uma profissão que lhe garantisse um bom salário mensal.

Ao atingir a mocidade, constituiu família, à qual se afeiçoou profundamente e, desde então, sentindo dentro de si o desejo de auxiliar o próximo, sendo médium passou a colaborar com um Centro Espírita.

Sacrificando as horas que poderia dedicar ao seu próprio descanso ou divertimento, encontrou tempo para as tarefas de socorro aos necessitados e assim viveu, durante muitos anos, cumprindo rigorosamente seus deveres profissionais e familiares, ao mesmo tempo em que trabalhava em favor de seus semelhantes.

Com isto conquistou amigos no mundo espiritual, entre os quais se contavam os Espíritos aos quais serviu de medianeiro nas tarefas do Centro Espírita.

Quando estes Espíritos perceberam que chegara a hora de Dimas, que estava gravemente enfermo, morrer na Terra para voltar ao mundo espiritual, cercaram-no de atenções, como nós também fazemos aqui na Terra, aos amigos que estimamos realmente.

Esses Espíritos, orientados por Jerônimo, entidade incumbida de dirigir o processo da desencarnação de Dimas, encaminharam-se para a sua residência, onde o encontraram prostrado no leito, rodeado pelos seus familiares.

Conta-nos, então, o Espírito André Luiz:

"... o transe era, sem dúvida, melindroso. A esposa do médium, ao pé dele, não obstante prolongadas vigílias e sacrifícios estafantes, que a expressão fisionômica denunciava, mantinha-se firme a seu lado, olhos vermelhos de chorar, emitindo forças de retenção amorosa que prendiam o moribundo em vasto emaranhado de fios cinzentos, dando-nos a impressão de peixe encarcerado em rede caprichosa.

O assistente Jerônimo apontou-a, bondoso, e explicou:

Nossa pobre amiga é o primeiro empecilho a remover. Improvisemos temporária melhora para o agonizante, a fim de sossegar-lhe a mente aflita.

Somente depois de semelhante medida conseguiremos retirá-lo, sem maior impedimento. As correntes de força, exteriorizadas por ela, infundem vida aparente aos centros de energia vital, já em adiantado processo de desintegração.

O assistente recomendou que dois Espíritos, Luciana e Hipólito, se mantivessem ao lado da senhora, modificando-lhe as vibrações mentais e instruindo-me para coadjuvar-lhe a influenciação, como se fazia mistér.

Enquanto mantinha as mãos coladas ao cérebro de Dimas, propiciando-lhe a renovação das forças gerais, Jerônimo aplicava-lhe passes longitudinais, desfazendo os fios magnéticos que se entrecruzavam sobre o corpo abatido.

Reparei que o moribundo já se encontrava em dolorosas condições. Plenamente desorganizado, o fígado começava definitivamente a paralisar as suas funções e o estômago, o pâncreas e o duodeno, apresentavam anomalias estranhas.

Os rins pareciam mortos. Os glomérulos prendiam-se aos ramos arteriais como pequeninos botões arroxeados. Os tubos coletores, enrijecidos, prenunciavam o fim do corpo. Sintomas de gangrena pesavam em toda a atmosfera orgânica.

O que mais impressionava, porém, era a movimentação da fauna microscópica. Corpúsculos das mais variadas espécies nadavam nos líquidos acumulados no ventre, concentrando-se particularmente no ângulo hepático, como a buscarem alguma coisa, com avidez, nas vizinhanças da vesícula.

O coração trabalhava com dificuldade. Enfim, o enfraquecimento atingira o auge.

Precisamos oferecer-lhe as melhoras fictícias - asseverou o assistente de nossas atividades - tranquilizando-lhe os parentes aflitos. A câmara está repleta de substâncias mentais torturantes.

O assistente passou, então, a exercer intensivamente a sua influência.

Dimas, de raciocínio obscurecido pela dor, não divisava a nossa presença. Os atritos celulares, pelo rápido desenvolvimento dos vírus portadores do coma, impediam-lhe percepções claras. As proveitosas faculdades mediúnicas que ele possuía haviam caído em temporário eclipse, ante os choques do sofrimento. Era, porém, extremamente sensível à atuação magnética.

Pouco a pouco, com a interferência de Jerônimo, o amigo acalmou-se, respirou em rítmo quase normal, abriu os olhos fundos e exclamou reconfortado:

- Graças a Deus! Louvado seja Deus!

Um dos filhos, a contemplá-lo, de olhos súplices, seguiu-lhe as palavras, ansioso, indagando num gesto de alívio:

- Melhorou, papai?

- Oh! Sim, meu filho, agora respiro mais livremente ...

- Sente os amigos espirituais a seu lado? - tornou o rapaz, cheio de fé.

O enfermo sorriu, algo triste, e retrucou:

- Não. Quero crer que o sofrimento físico cerrou a porta que me comunicava com a esfera invisível. Mesmo assim, estou confiante, Jesus não nos desampara.

Fixou a companheira, em lágrimas, e aduziu:

Todos nós experimentaremos a solidão nos grandes momentos de aferir valores espirituais. Estou convencido de que os nossos Guias do Plano Superior não me olvidarão as necessidades ... entretanto ... não devo esperar que tomem cuidado permanente comigo ...

Falava em voz quase imperceptível, em virtude do abatimento, entrecortando as palavras na respiração opressa.

A senhora, vacilante, estava inteiramente amparada por Luciana, que a abraçava afetuosa. Viam-se-lhe os sinais de angustioso cansaço. Lágrimas espessas corriam-lhe dos olhos congestionados.

Jerônimo, agora, pousava a destra na fronte do moribundo, proporcionando-lhe força, inspiração e idéias favoráveis ao desdobramento de nossos serviços. Dimas mostrou novo brilho no olhar, encarou a companheira, esforçando-se por parecer tranquilo e rogou:

- Querida, vá descansar!... Peço-lhe... Tantas noites a fio, de sentinela, acabarão por aniquilá-la. Que será de mim, doente e exausto, se o desânimo surpreender-nos a todos?

Fez mais longo intervalo e prosseguiu:

- Repouse a meu pedido. Ficaria tão satisfeito se a visse mais forte... Não se retarde. Sinto-me muito melhor e sei que o dia será de calma e reconforto.

Cedendo às insistências do esposo e docemente constrangida pela influência de Luciana e Hipólito, a matrona recolheu-se ao quarto.

Em vista das melhoras obtidas, houve expansão de júbilo familiar.

O médico foi chamado. Radiante, o clínico asseverou que os prognósticos contrariavam suposições anteriores. Renovou as indicações, dispensou os anestésicos e recomendou ao pessoal doméstico que entregasse o doente ao repouso absoluto. Dimas acusava melhoras surpreendentes. Era razoável, portanto, que a câmara fosse deixada em silêncio, para que ele tivesse um sono reparador.

O esculápio atendia-nos o desejo.

Em breves minutos, o compartimento ficou solitário, facilitando-nos o serviço.

O assistente distribuiu trabalho a todos nós.

Hipólito e Luciana, depois de tecerem uma rede fluídica de defesa em torno do leito, para que as vibrações mentais inferiores fossem absorvidas, permaneceram em prece ao lado, enquanto eu mantinha a destra sobre o plexo solar do agonizante.

Iniciaremos, agora, as operações decisivas - declarou-nos Jerônimo, resoluto. Antes, porém, forneçamos ao amigo a oportunidade da oração final.

O assistente tocou-o, demoradamente, na parte posterior do cérebro. Vimos que o agonizante passou a emitir pensamentos luminosos e belos. Não nos via nem nos ouvia, de maneira direta, mas conservava a intuição clara e ativa. Sob o controle de Jerônimo, experimentou imperiosa necessidade de orar e, embora os lábios cansados prosseguissem imóveis, assinalamos a rogativa mental que endereçava ao Divino Mestre.

Divino Mestre:

Meu Senhor Jesus Cristo, creio que atingi o fim de meu corpo, do corpo que me deste, por algum tempo, como dádiva preciosa e bendita. Eu não sei, Senhor, quantas vezes feri a máquina fisiológica que me confiaste. Inconscientemente, quebrei-lhe as peças com o meu descaso, menosprezando patrimônios sagrados, cujo valor estou reconhecendo em mais de doze meses de sofrimento carnal incessante. Não te posso implorar a benção da morte pacífica, porque nada fiz de bom ou de útil por merecê-la. Mas, se é possível, Amado Médico, socorre-me com o teu compassivo e desvelado amor! Curastes paralíticos, cegos e leprosos ... Porque não te compadecerás de mim, miserável peregrino da Terra?

Seus olhos deixaram escapar lágrimas abundantes.

Após breves minutos, observamos que o agonizante recordava a meninice distante. Na tela miraculosa da memória, revia o colo materno e sentia sede do carinho da mãe. Oh! Se pudesse contar com o socorro da abençoada velhinha, que a morte arrebatara há tantos anos, refletia.

Premido pelas doces reminiscências, modificou o quadro da súplica, lembrou a cena da crucificação de Jesus, insistiu mentalmente por vislumbrar o vulto sublime de Maria e, sentindo-se de joelhos, diante dela, implorou:

- Mãe dos céus, mãe das mães humanas, refúgio dos órfãos da Terra, sou agora, também, o menino frágil com fome do afeto maternal nesta hora suprema! Oh! Senhora Divina, mãe de meu Mestre e de meu Senhor, digna-te abençoar-me! Lembra que teu filho divino pôde ver-te no derradeiro instante e intercede por mim, mísero servo, para que eu tenha minha santa mãe ao meu lado no minuto de partir! Socorre-me! Não me abandone, anjo tutelar da humanidade, bendita entre as mulheres!

Oh! Providência maravilhosa do Céu! Convertera-se o coração do moribundo em foco radioso e a porta de acesso deu entrada a venerável anciã, coroada de luz, semelhando neve luminosa. Ela se aproximou de Jerônimo e informou, após desejar-nos a paz divina:

- Sou a mãe dele.

O assistente comentou a urgência da tarefa que nos aguardava e confiou-lhe o depósito querido.

Em breves instantes tínhamos, perante os olhos, inolvidável quadro afetivo. Sentara-se a velhinha no leito, depondo a cabeça do moribundo no regaço acolhedor, afagando-a com as mãos cariciosas.

Em virtude do reforço valioso no setor da colaboração, Hipólito e Luciana, atendendo ao nosso dirigente, foram velar pelo sono da esposa, para que suas emissões mentais não nos alterassem o esforço.

No recinto, permanecemos os três apenas.

Dimas, experimentando indefinível bem-estar no regaço materno, parecia esquecer, agora, todas as mágoas, sentindo-se amparado como criança semi-inconsciente, quase feliz.

Ordenou Jerônimo que me conservasse vigilante, de mãos coladas à fronte do enfermo, passando, logo após, ao serviço complexo e silencioso de magnetização.

Em primeiro lugar, insensibilizou inteiramente o vago, para facilitar o desligamento nas vísceras. A seguir, utilizando passes longitudinais, isolou todo o sistema nervoso simpático, neutralizando, mais tarde, as fibras inibidoras do cérebro. Descansando alguns segundos, asseverou:

- Noutro tempo, André, os antigos acreditavam que entidades mitológicas cortavam os fios da vida humana. Nós somos Parcas autênticas, efetuando semelhante operação ...

E porque eu indagasse, tímido, por onde iríamos começar, explicou-me o orientador:

Segundo você sabe, há três regiões orgânicas fundamentais que demandam extremo cuidado nos serviços de liberação da alma: o centro vegetativo, ligado ao ventre, como sede das manifestações fisiológicas; o centro emocional, zona dos sentimentos e desejos, sediado no tórax; e o centro mental, mais importante por excelência, situado no cérebro.

Minha curiosidade intelectual era enorme. Entendendo, porém, que a hora não comportava longos esclarecimentos, abstive-me de indagações.

Jerônimo, todavia, gentil como sempre, percebeu-me o propósito de pesquisa e acrescentou:

Noutro ensejo, André, você estudará o problema transcendente das várias zonas vitais da individualidade.

Aconselhando-me cautela na ministração de energia à mente do moribundo, começou a operar sobre o plexo solar, desatando laços que localizavam forças físicas. Com espanto, notei que certa porção de substância leitosa extravasava do umbigo, pairando em torno. Esticaram-se os membros inferiores, com sintomas de resfriamento.

Dimas gemeu, em voz alta, semi-inconsciente.

Acorreram amigos, assustados. Sacos de água quente foram-lhe apostos nos pés. Mas, antes que os familiares entrassem em cena, Jerônimo, com passes concentrados sobre o tórax, relaxou os elos que mantinham a coesão celular do centro emotivo, operando determinado ponto do coração, que passou a funcionar como bomba mecânica, desreguladamente. Nova cota de substância desprendeu-se do corpo, do epigastro à garganta, mas reparei que todos os músculos trabalhavam fortemente contra a partida da alma, opondo-se à libertação das forças motrizes, em esforços desesperados, ocasionando angustiosa aflição ao paciente. O campo físico oferecia-nos resistência, insistindo pela retenção do senhor espiritual.

Com a fuga do pulso foram chamados os parentes e o médico, que acorreram pressurosos. No regaço maternal, todavia, e sob nossa influenciação direta, Dimas não conseguiu articular palavras ou concatenar raciocínios.

Alcançáramos o coma, em boas condições.

O assistente estabeleceu reduzido tempo de descanso, mas voltou a intervir no cérebro. Era a última etapa. Concentrando todo o seu potencial de energia na fossa romboidal, Jerônimo quebrou alguma coisa que não pude perceber com minúcias, e brilhante chama violeta-dourada desligou-se da região craniana absorvendo, instantaneamente, a vasta porção de substância leitosa já exteriorizada.

Quis fitar a brilhante luz, mas confesso que era difícil fixá-la com rigor. Em breves instantes, porém, notei que as forças em exame eram dotadas de movimento plasticizante.

A chama mencionada transformou-se em maravilhosa cabeça, em tudo idêntica à do nosso amigo em desencarnação, constituindo-se, após ela, todo o corpo perispiritual de Dimas, membro a membro, traço a traço.

E, à medida que o novo organismo ressurgia ao nosso olhar, a luz violeta-dourada, fulgurante no cérebro, empalidecia gradualmente, até desaparecer de todo, como se representasse o conjunto dos princípios superiores da personalidade, momentaneamente recolhidos a um único ponto, espraiando-se, em seguida, através de todos os escaninhos do organismo perispirítico, assegurando, desse modo, a coesão dos diferentes átomos, das novas dimensões vibratórias.




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