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CURSO BÁSICO DE ESPIRITISMO

Parte 1 - Capítulo 11

Desencarnação - A separação da alma, do corpo


Para estudarmos o problema da desencarnação, ou morte do corpo físico, primeiro transcreveremos o que consta do "Livro dos Espíritos", sobre o assunto, sob o título "separação da alma e do corpo".

A seguir, nesta ou nas aulas seguintes sobre o mesmo tema, registraremos o que Kardec escreveu no livro "O Céu e o Inferno" e, também, o que consta no livro "Obreiros da Vida Eterna", escrito pelo Espírito André Luiz, pela psicografia do médium Francisco Cândido Xavier.

Allan Kardec, ao escrever o "Livro dos Espíritos", registrou as perguntas que fez quanto ao problema e as respostas que recebeu dos Espíritos:

--------P - É dolorosa a separação da alma, do corpo?

--------R - "Não, o corpo quase sempre sofre mais durante a vida do que no momento da morte. A alma nenhuma parte toma nisso. Os sofrimentos que algumas vezes se experimentam no instante da morte são um gozo para o Espírito, que vê chegar o termo do seu exílio".

--------P - Como se opera a separação da alma e do corpo?

--------R - "Rotos os laços que a retinham, ela se desprende".

--------P - A separação se dá instantaneamente, por brusca transição? Haverá alguma linha de demarcação nitidamente traçada entre a vida e a morte?

--------R - "Não, a alma se desprende gradualmente, não se escapa como um pássaro cativo, a quem se restitua subitamente a liberdade. Aqueles dois estados se tocam e confundem, de sorte que o Espírito se solta pouco a pouco dos laços que o prendiam. Estes laços se desatam, não se quebram".

Comentário de Allan Kardec: "Durante a vida, o Espírito se acha preso ao corpo pelo seu envoltório semi-material ou perispírito. A morte é a destruição do corpo somente, não a desse outro invólucro, que do corpo se separa quando cessa a vida orgânica".

A observação demonstra que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente. Que, ao contrário, se opera gradualmente e com uma lentidão muito variável, conforme os indivíduos.

Em uns é bastante rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é mais ou menos o da libertação. Em outros, naqueles sobretudo cuja vida foi toda material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido durando, algumas vezes, dias, semanas e até meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade, nem a possibilidade de volver à vida, mas uma simples afinidade com o Espírito.

--------P - O Espírito se encontra imediatamente com os que conheceu na Terra e que morreram antes dele?

--------R - "Sim, conforme a afeição que lhes votava e a que eles lhe consagravam. Muitas vezes aqueles seus conhecidos o vêm receber à entrada do mundo espiritual e o ajudam a desligar-se das faixas da matéria. Encontra-se, também, com muitos dos que conheceu e perdeu de vista durante a sua vida terrena. Vê os que estão na erraticidade, como vê os encarnados e os vai visitar".

--------P - Em caso de morte violenta e acidental, quando os órgãos ainda não se enfraqueceram em consequência da idade ou das moléstias, a separação da alma e a cessação da vida ocorrem simultaneamente?

--------R - "Geralmente assim é mas, em todos os casos, muito breve é o instante que medeia entre uma e outra".

A certeza da vida futura não exclui as apreensões quanto à passagem desta para a outra vida. Há muita gente que teme não a morte em si, mas o momento da transição.

Sofremos ou não nessa passagem?

Por isso se inquietam e, com razão, visto que ninguém foge à lei fatal dessa transição. Podemos dispensar-nos de uma viagem neste mundo, menos dessa. Ricos e pobres, devem todos fazê-la e, por dolorosa que seja a franquia, nem posição nem fortuna poderiam suavizá-la.

Vendo-se a calma de alguns moribundos e as convulsões terríveis de outros pode-se, previamente, julgar que as sensações experimentadas nem sempre são as mesmas.

Quem poderá, no entanto, esclarecer-nos a tal respeito? Quem nos descreverá o fenômeno fisiológico da separação entre a alma e o corpo? Quem nos contará as impressões desse instante supremo, quando a Ciência e a Religião se calam? E calam-se porque lhes falta o conhecimento das leis que regem as relações do Espírito e da matéria, parando uma nos umbrais da vida espiritual e a outra nos da vida material.

O Espiritismo é o traço de união entre as duas, e só ele pode dizer-nos como se opera a transição, quer pelas noções mais positivas da natureza da alma, quer pela descrição dos que deixaram este mundo.

O conhecimento do laço fluídico que une a alma ao corpo é a chave desse e de muitos outros fenômenos.

A insensibilidade da matéria inerte é um fato, e só a alma experimenta sensações de dor e de prazer. Durante a vida, toda a desagregação material repercute na alma que, por esse motivo, recebe uma impressão mais ou menos dolorosa.

É a alma e não o corpo quem sofre, pois este não é mais que instrumento da dor: aquela é o paciente.

Após a morte, separado da alma, o corpo pode ser impunemente mutilado que nada sentirá. A alma, por insulada, nada experimenta da destruição orgânica.

A alma tem sensações próprias, cuja fonte não reside na matéria tangível.

O perispírito é o envoltório da alma e não se separa dela nem antes e nem depois da morte. Ele não forma com ela mais que uma só entidade e nem mesmo se pode conceber uma sem o outro.

Durante a vida, o fluído perispirítico penetra o corpo em todas as suas partes e serve de veículo às sensações físicas da alma, do mesmo modo como esta, por seu intermédio, atua sobre o corpo e dirige-lhe os movimentos.

A extinção da vida orgânica acarreta a separação da alma em consequência do rompimento do laço fluídico que a une ao corpo, mas essa separação nunca é brusca. O fluído perispiritual só pouco a pouco se desprende de todos os órgãos, de sorte que a separação só é completa e absoluta quando não mais restar um átomo do perispírito ligado a uma molécula do corpo.

A sensação dolorosa da alma, por ocasião da morte, está na razão direta da soma dos pontos de contacto existentes entre o corpo e o perispírito e, por conseguinte, também da maior ou menor dificuldade que apresenta o rompimento.

Não é preciso, portanto, dizer que, conforme as circunstâncias, a morte pode ser mais ou menos penosa. Estas circustâncias é que nos cumpre examinar.

Estabelecemos, em primeiro lugar, e como princípio, os quatro seguintes casos, que podemos reputar situações extremas, dentro de cujos limites há uma infinidade de variantes:

--------Se, no momento em que extingue a vida orgânica, o desprendimento do perispírito fosse completo, a alma nada sentiria, absolutamente;

--------Se, nesse momento, a coesão dos dois elementos estiver no auge de sua força, produz-se uma espécie de ruptura, que reage dolorosamente sobre a alma;

--------Se a coesão for fraca, a separação torna-se fácil e opera-se sem abalo;

--------Se, após a cessação completa da vida orgânica, existirem ainda numerosos pontos de contacto entre o corpo e o perispírito, a alma poderá ressentir-se dos efeitos da decomposição do corpo, até que o laço inteiramente se desfaça. Daí resulta que o sofrimento, que acompanha a morte, está subordinado à força adesiva que une o corpo ao perispírito, que tudo o que puder atenuar essa força e acelerar a rapidez do desprendimento, torna a passagem menos penosa e, finalmente, que se o desprendimento se operar sem dificuldades, a alma deixará de experimentar qualquer sentimento desagradável.

Na transição da vida corporal para a espiritualidade produz-se, ainda, outro fenômeno de importância capital - a perturbação.

Nesse instante, a alma experimenta um torpor que paralisa momentaneamente as suas faculdades neutralizando, ao menos em parte, as sensações. É como se disséssemos um estado de catalepsia, de modo que a alma quase nunca testemunha conscientemente o derradeiro suspiro.

Dizemos quase nunca, porque há casos em que a alma pode contemplar conscientemente o desprendimento, como em breve veremos.

A perturbação pode, pois, ser considerada o estado normal no instante da morte e perdurar por tempo indeterminado, variando de algumas horas a alguns anos.

À proporção que se liberta, a alma encontra-se numa situação comparada à de um homem que desperta de profundo sono. As idéias são confusas, vagas, incertas. A vista apenas distingue como que através de um nevoeiro, mas pouco a pouco se aclara, desperta-se-lhe a memória e o conhecimento de si mesma.

Bem diverso é, contudo, esse despertar. Calmo, para uns, acorda-lhe sensações deliciosas. Tétrico, aterrador e ansioso, para outros, é qual horrendo pesadelo.

O último alento quase nunca é doloroso uma vez que, ordinariamente, ocorre em momento de inconsciência, mas a alma sofre antes a desagregação da matéria nos estertores da agonia e, depois, as angústias da perturbação.

Demo-nos pressa em afirmar que esse estado não é geral, porquanto a intensidade e duração do sofrimento estão na razão direta da afinidade existente entre o corpo e o perispírito. Assim, quanto maior for essa afinidade, tanto mais penosos e prolongados serão os esforços da alma para desprender-se.

Há pessoas nas quais a coesão é tão fraca que o desprendimento se opera por si mesmo, como que naturalmente. É como se um fruto maduro se desprendesse do seu caule, e é o caso das mortes calmas, de pacífico despertar.

A causa principal da maior ou menor facilidade de desprendimento é o estado moral da alma. A afinidade entre o corpo e o perispírito é proporcional ao apego à matéria, que atinge o seu máximo no homem cujas preocupações dizem respeito exclusiva e unicamente à vida e gozos materiais. Ao contrário, nas almas puras, que antecipadamente se identificam com a vida espiritual, o apego é quase nulo. E, desde que a lentidão e a dificuldade do desprendimento estão na razão do grau de pureza e desmaterialização da alma, depende somente de nós tornar fácil ou penoso, agradável ou doloroso, esse desprendimento.

Por isto, quer como teoria, quer como resultado de observações, resta-nos examinar a influência do gênero de morte sobre as sensações da alma nos últimos transes. E é o que faremos na próxima aula.

Em se tratando de morte natural, resultante da extinção das forças vitais por velhice ou doença, o desprendimento opera-se gradualmente. Para o homem cuja alma se desmaterializou e cujos pensamentos se destacam das coisas terrenas, o desprendimento quase se completa antes da morte real, isto é, ao passo que o corpo ainda tem vida orgânica, já o Espírito penetra a vida espiritual, apenas ligado por "elo" frágil que se rompe com a última batida do coração.

Nesta contingência, o Espírito pode já ter recuperado a lucidez, de molde a tornar-se testemunha consciente da extinção da vida do corpo, considerando-se feliz por tê-lo deixado. Para este, a perturbação é quase nula, ou antes, não passa de ligeiro sono calmo, do qual desperta com indizível impressão de esperança e ventura.

No homem materializado e sensual, que mais viveu do corpo que do Espírito, e para o qual a vida espiritual nada significa, nem sequer lhe toca o pensamento, tudo contribui para estreitar os laços materiais e, quando a morte se aproxima, o desprendimento, conquanto se opere gradualmente, também demanda contínuos esforços.

As convulsões de agonia são indícios da luta do Espírito que, às vezes, procura romper os elos resistentes, e outras se agarra ao corpo do qual uma força irresistível o arrebata com violência, molécula por molécula.

Quanto menos vê o Espírito, além da vida corporal, tanto mais se lhe apega e, assim, sente que ela lhe foge e quer retê-la. Em vez de se abandonar ao movimento que o empolga, resiste com todas as forças e, pode mesmo, prolongar a luta por dias, semanas ou meses inteiros.

Certo, nesse momento, o Espírito não possui a lucidez, visto como a perturbação de muito se antecipou à morte. Mas nem por isso sofre menos, e o vácuo em que se acha e a incerteza do que lhe sucederá, agravam-lhe as angústias.

Dá-se, por fim, a morte e, nem por isso, está tudo terminado. A perturbação continua, ele sente que vive, mas não define se material, se espiritualmente. Luta e luta, ainda, até que as últimas ligações do perispírito se tenham de todo rompido.

A morte pôs termo à moléstia efetiva. Porém, não lhe sustou as consequências e, enquanto existirem pontos de contacto do perispírito com o corpo, o Espírito ressente-se e sofre com as suas impressões.

Quão diversa é a situação do Espírito desmaterializado, mesmo nas enfermidades mais cruéis! Sendo frágeis os laços fluídicos que o prendem ao corpo, rompem-se suavemente.

Depois, a confiança no futuro entrevisto em pensamento ou na realidade, como sucede algumas vezes, fá-lo encarar a morte qual redenção, e as suas consequências como prova, advindo-lhe daí uma calma resignada, que lhe ameniza o sofrimento.

Após a morte, rotos os laços, nem uma só reação dolorosa que o afete. O despertar é lépido, desembaraçado. Por sensações únicas, o alívio, a alegria!

Na morte violenta, as sensações não são precisamente as mesmas. Nenhuma desagregação inicial há começando previamente a separação do perispírito. A vida orgânica, em plena exuberância de força, é subitamente aniquilada.

Nestas condições, o desprendimento só começa depois da morte do corpo e não pode completar-se rapidamente. O Espírito, colhido de improviso, fica como que aturdido e sente, e pensa, e acredita-se vivo, prolongando-se esta ilusão até que compreenda o seu estado.

Este estado intermediário entre a vida corporal e a espiritual é dos mais interessantes para ser estudado, porque apresenta o espetáculo singular de um Espírito que julga material o seu corpo fluídico, experimentando ao mesmo tempo todas as sensações da vida orgânica.

Há, além disso, dentro desse caso, uma série infinita de modalidades, que variam segundo os conhecimentos e progressos morais do Espírito.

Para aqueles cuja alma está purificada, a situação pouco dura, porque já possuem em si como que um desprendimento antecipado, cujo termo a morte mais súbita não faz apressar. Outros há para os quais a situação se prolonga por anos inteiros.

Essa é uma situação muito frequente, até nos casos de morte comum, que nada tendo de penosa para Espíritos adiantados, se torna horrível para os atrasados.

No suicida, principalmente, excede a todas as expectativas. Preso ao corpo por todas as suas fibras, o perispírito faz repercutir na alma todas as sensações daquele, com sofrimentos cruciantes.

O estado do Espírito, por ocasião da morte, pode ser assim resumido: Tanto maior é o sofrimento, quanto mais lento for o desprendimento do perispírito. A presteza desse desprendimento está na razão direta do adiantamento moral do Espírito. Para o Espírito desmaterializado, de consciência pura, a morte é qual um sono breve, isento de agonia, e cujo despertar é suavíssimo.



Referências bibliográficas:
O Livro dos Espíritos" - parte segunda capítulo III
O Céu e o Inferno - segunda parte - capítulo I




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